Em nosso século (XIX), falou-se e fala-se muito de «instrução» e mesmo de «instrução pública», assim como de «instrução obrigatória».
Mas há um ponto essencial sobre o qual o mais freqüente é não ter ele merecido mais do que uma atenção superficial. Não se indaga, antes de tudo, a quem se teria de ensinar.
Isso no entanto valeria a pena, pois geralmente, senão universalmente, as pessoas a quem devemos ensinar são pessoas batizadas.
Pessoas batizadas! O que quer isto dizer? Quer dizer que uma criança batizada, tendo recebido de Deus na ocasião de seu batismo graças que modificaram poderosamente as condições de sua inteligência, é preciso ter este fato em consideração quando se deseja falar a essa inteligência assim modificada. Deus tendo pelo batismo incutido na alma da criança o «hábito» da fé[1], daí decorre infalivelmente esta alma ter uma inclinação muito forte para as verdades da fé e uma necessidade premente de recebê-las para assimila-las, nutrir-se delas e passar, na fé, do hábito ao ato.
Se antes de tudo entregarem à criança o alimento que ela reclama, verão sua inteligência, se bem que ainda em plena aurora, regozijar-se com uma alegria maravilhosa e logo depois desenvolver-se e desabrochar. Pois se o homem terrestre vive de pão, o homem inteligente e cristão vive da verdade.
Se, ao contrário, pouco se preocupando com as várias necessidades da criança, não tiverem para entregar-lhe senão frias nomenclaturas ou definições gramaticais, que ela não compreenderá senão dez anos mais tarde, ou talvez nunca, acontecerá infalivelmente isto: enganada no que almeja, frustrada em suas aspirações mais legítimas e mais santas, a inteligência da criança se entorpecerá, se estiolará; e, acometida de uma espécie de tísica sui generis, ela forçará os senhores professores das escolas primárias a constatar que o nível intelectual vai sempre baixando. Isso é notório, infelizmente. Pode-se saber ler e escrever. Mas não se sabe nem pensar o que se escreve, nem julgar o que se lê. Verdadeira carência intelectual.
Mães cristãs, querem evitar semelhantes desgraças a seus filhos queridos? Trabalhem para consegui-lo. Nós lhes ajudaremos. De início diremos que há três maneiras ou métodos de ensinar religião:
- O primeiro seria o método que iria de sua memória à memória de seu filho;
- O segundo que se originaria de sua inteligência indo à inteligência dele;
- O terceiro, enfim, de sua fé à fé dele.
O primeiro método reina em muitas escolas, o segundo igualmente; o terceiro é hoje o privilégio quase exclusivo, e grande honra, das mães cristãs.
O método que nós chamamos «da memória» é um método fácil. Hoje se deseja que tudo seja fácil; mas sem dúvida este é o método necessário para a instrução do animal. Há animais ensinados. Aplicado ao cristão, este método é consideravelmente depreciativo para sua alma. Para o cristão, o espírito é o ponto importante da alma, é a sua cidadela interior. É onde deve reinar a verdade: agora pela fé, no Céu pela visão de Deus. É, portanto, ao espírito da criança que é preciso visar. Se se dirigirem só à sua memória; se ensinarem à criança o Catecismo como ensinam a Gramática; se fizerem recitar a História Sagrada igual a Geografia, podem não ter feito mais do que constatar se sua memória reteve fielmente o que leu no livro. Terão praticado grande dano a seu espírito que, não recebendo o alimento e o estímulo que lhe são indispensáveis, se abaterá e cairá de inanição.
O segundo método é muito superior ao precedente, ao menos vai de inteligência a inteligência. Uma pessoa que sabe, dirige-se à criança para ensinar-lhe. Este segundo método força a inteligência da criança a trabalhar e a habitua a raciocinar e lhe faz sentir o poder de uma demonstração. Com tudo isso, porém, este método não poderá fazer senão pessoas instruídas, pois não atende a todas as necessidades de um batizado. Se à força de querer ensinar ciência ao aluno esquecerem as aspirações de sua alma cristã; se não trabalharem para vivificar a fé de seu batismo, os tesouros depositados na alma pelo Batismo, pela Confirmação, pela Eucaristia irão se consumindo e um dia, finalmente, o homem que foi instruído por vocês deixará de crer. Não se diz que muitos homens perderam a fé estudando, e até estudando teologia? Portanto, embora este método possa produzir eruditos, é insuficiente, pois não forma crentes. Se o primeiro método prejudica a inteligência, o segundo prejudica a fé.
Precisam então, ó mães cristãs, sem negligenciar a memória, sem negligenciar todos os recursos de suas inteligências e da de seus filhos, precisam de um método mais poderoso, mais seguro, mais adaptado ao fim a que se propõem. Será o método que vai direto, já dissemos, da sua fé à fé de seu filho. Sua inteligência de batizado reclama algo que todos os livros do mundo não lhe poderiam dar. «A letra mata», diz São Paulo, em sua linguagem divinamente enérgica. A esta querida alma batizada é preciso fazer compreender aquilo que o mesmo São Paulo chama de «verbum fidei», a palavra da fé. Um hebraísmo, é verdade, mas que em português quer dizer: A fé falada. A fé falada! Sim, eis aí, mãe cristã, o leite espiritual que seu filho pede. Dê-lhe, seja mãe por inteiro e não babá. A criança pede em primeiro lugar a palavra e não o livro, o livro virá a seu tempo. Mas se crerem, ó mães, falem de sua fé aos seus filhos; eles são batizados e portanto aptos a lhes escutar; eles acreditarão, pela graça de seu batismo e sua alma dirá: «Tenho meu pão, eu vivo».
Continua... [1] Pe. Emmanuel emprega a palavra hábito no sentido filosófico de habitus, que significa: disposição estável [N. da P.]
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