Contra a verdade não temos poder algum; temo-lo apenas em prol da verdade. (II Coríntios 13,8)

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Oração composta por Santo Afonso Maria de Ligório

“Senhor, porque tenho eu perdido tantos anos, nos quais não vos tenho amado?
Anos infelizes, eu vos detesto; e a vós bendigo, ó paciência infinita do meu Deus, que tantos anos me tendes suportado.
Apesar de tão ingrato, vós me esperais ainda: porque, meu Deus, por quê?
A fim de que, um dia, vencido pelas vossas misericórdias e pelo vosso amor, eu me dê inteiramente a vós.
Senhor, não quero mais ser ingrato para convosco.
É justo que vos consagre o tempo, que ainda me resta de vida, quer pouco quer muito.
Espero, meu Jesus, que me auxiliareis a ser todo vosso; pois, se tanto me favorecestes, quando eu vos fugia e desprezava o vosso amor, como não devo esperar que me favoreçais agora que vos procuro e vos desejo amar, Deus digno de um amor infinito?
Amo-vos de todo o meu coração, amo-vos sobre todas as coisas, amo-vos mais que a mim mesmo, mais do que minha própria vida.
Arrependo-me de vos haver ofendido, bondade infinita. Perdoai-me e, com o perdão, concedei-me a graça de vos amar muito nesta vida até à morte e, na outra, por toda a eternidade.
Pelo vosso poder, Deus todo-poderoso, mostrai ao mundo este prodígio: uma alma tão ingrata como a minha, convertida numa das mais fervorosas no vosso amor.
Fazei-o pelos vossos méritos, meu Jesus. Isto é o que proponho fazer durante toda a minha vida; vós que me inspirais este desejo, dai-me forças para o pôr em prática”.

Amem

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Cartas sobre a Fé - Primeira Carta


Por Pe. Emmanuel-André.

A NATUREZA DA FÉ

A senhora leu com muita atenção certo post scriptum do nosso catecismo e pede-me para escrever-lhe uma carta respondendo a uma pergunta: «o que é, pois, a Fé?»

A pergunta é curta, a resposta será longa. Vou lhe escrever uma carta, duas cartas, três cartas e talvez até mais.

Sem mais demora, entro no assunto.

A senhora tem filhos amáveis e amados que Deus lhe deu; e é por causa deles que me pergunta: o que é a Fé? Responderei; e precisamente por eles encontrarei um meio fácil de dizer o que é a Fé.

Note bem: a senhora conhece seus filhos, e sabe que eles são seu filhos, mas a posição deles em relação à senhora não é exatamente a mesma. Pois, se é verdade que eles a conhecem, é preciso convir que eles não têm outro remédio senão acreditar que a senhora é mãe deles. Digo que eles têm de acreditar porque nunca terão a prova de visu deste fato. Foi a senhora quem lhes disse e no que ouviram, creram: eles o receberam com uma confiança perfeita, quase se poderia dizer, cega; pois se uma outra mulher tivesse cuidado deles como a senhora cuidou, e lhes tivesse testemunhado alguma afeição, eles a chamariam mamãe, levados por um impulso natural.

Veja por esse exemplo como crer é natural ao homem, pois ele tem necessidade de crer, primeiramente em seu pai e sua mãe. Nunca sobre esse ponto o homem pode chegar a uma demonstração, ele deve crer. Isto faz parte da ordem natural, e ele crê. É por isto que o homem chama seu pai de pai e sua mãe de mãe.

Assim, os primeiros conhecimentos do homem são conhecimentos não demonstrados mas aceitos com inteira segurança, confiado na palavra do pai e da mãe. A criança viverá muito tempo neste estado, em perfeita segurança, sob a autoridade de seus pais. Diz Santo Agostinho: «É da ordem natural que a autoridade preceda a razão». E adiante: «A autoridade exige a Fé e prepara o homem para a razão». Quando, mais tarde, a razão da criança estiver formada, ela poderá se basear nela; mas antes disso, é indispensável que o homem creia; é um bem que lhe é necessário, que Deus lhe preparou em sua paternal solicitude, e que o homem recebe sem a menor dificuldade. Ouçamos ainda Santo Agostinho: «Uma coisa é acreditarmos confiados na autoridade, outra na razão. Crer pela autoridade é muito vantajoso e não dá trabalho».

Vê-se assim como a criança está sob a tutela de seus pais. Ela crê naquilo que seus pais sabem; crê, sem demonstração, naquilo de que seus pais têm a demonstração e a evidência. Santo Agostinho diz que é assim na ordem natural, e protegida por esta ordem natural a criança se sente bem e efetivamente está bem. Podemos, pois, dizer agora que, assim como a criança está sob a tutela de seus pais na terra, o cristão está sob a tutela de seu Pai que está no Céu crendo na palavra de Deus como ele crê na palavra de seu pai, e tendo Fé em Deus como tem fé em seu pai. E a senhora poderá então compreender sem dificuldade o que é a Fé.

X

Chego ao fim a que me propus. A senhora fala a seu filho, ele ouve, ele crê; é a fé humana correspondendo à autoridade humana natural que Deus lhe deu sobre seu filho.

E como o pai na Terra tem autoridade para ensinar a seu filho e pode exigir dele a docilidade, quer dizer a fé, Deus, o Pai dos seres espirituais como diz São Paulo, tem também autoridade para falar às almas, e para exigir delas a fé.

O pai sabe uma porção de coisas que o filho não sabe e que o filho deve crer. Deus sabe também muitas coisas que o homem não sabe, e que deve crer porque Deus disse, quando deu ao homem a honra de lhe falar.

Veja a semelhança. Ela é perfeita e no entanto é preciso notar uma diferença considerável que a senhora verá sem dificuldade. A senhora fala a seu filho, ele acredita no que a senhora diz, é natural. A criança encontra em sua própria natureza tudo que é necessário para crer. A fé que sua palavra exige dele não o eleva acima de sua natureza. Mas quando Deus, o Pai dos seres espirituais, fala à sua criatura, como seu desígnio é eleva-la acima de si mesma e de fazê-la participar, não mais de uma simples verdade natural, e sim de uma verdade de natureza divina, portanto superior à natureza humana, em outros termos, sobrenatural, o homem não encontra mais em sua natureza capacidade suficiente para receber um ensinamento que o excede e que vença a distância de Deus ao homem. Então, se Deus quer que acreditem em sua palavra, é absolutamente necessário que eleve até Ele mesmo, quer dizer sobrenaturalmente, a faculdade natural que o homem tem de crer. E quando Deus concede este benefício ao homem, dizemos que Ele lhe deu a graça da Fé. A senhora compreende agora, porque está dito no princípio do Catecismo que a Fé é um dom de Deus.

Eu creio!

Continua...

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Entrevista com MONSENHOR RANJITH

Entrevista de Sua Excia. Mons. Albert Malcolm Ranjith, Arcebispo Secretário da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos.


Cidade do Vaticano (Agência Fides) – No dia 14 de Setembro entrou em vigor o Motu Proprio Summorum Pontificum promulgado pelo Papa Bento XVI, em 7 de Julho de 2007 e dedicado ao rito de São Pio V revisto, em 1962, pelo Papa João XXIII. Com o Motu Proprio (iniciativa promovida por quem tem poder para isso) volta a possibilidade de celebrar com o Missal Tridentino sem necessariamente ter que pedir permissão ao Bispo. Com o Concílio Vaticano II e em particular com a reforma litúrgica de 1970, promovida pelo Papa Paulo VI, o antigo Missal fora substituído pelo novo e, ainda que não tivesse sido jamais abolido, os fiéis para utilizá-lo tinham que pedir a expressa permissão do Bispo. Uma permissão exigida por um outro Motu Proprio: o Ecclesia Dei afflicta firmado pelo Papa João Paulo II, em 2 de Julho de 1988. Hoje, com o novo Motu Proprio, essa permissão não é mais necessária e qualquer "grupo estável" de fiéis pode livremente pedir ao próprio pároco a possibilidade de celebrar seguindo o antigo Missal. A Agência Fides, nesse sentido, dirigiu algumas perguntas a Sua Excia. Monsenhor Albert Malcolm Ranjith, Arcebispo Secretário da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos.


Excelência Reverendíssima, qual é, a seu ver o significado profundo do Motu Proprio Summorum Pontificum?


Vejo nessa decisão não só a solicitude do Santo Padre em abrir caminho para a reentrada à plena comunhão da Igreja para os seguidores de Monsenhor Lefebvre, mas também um sinal para toda a Igreja sobre alguns princípios teológico-disciplinares a salvaguardar tendo em vista uma sua profunda renovação, tão desejada pelo Concílio.

Parece-me que há nisso um forte desejo do Papa para corrigir aquelas tentações, patentes em alguns ambientes, que vêem o Concílio como um momento de ruptura com o passado, e como um novo início. Basta recordar seu discurso à Cúria Romana, em 22 de Dezembro de 2005. De outro lado, nem o Concílio pensou, nesses termos. Seja em suas escolhas doutrinárias, seja nas litúrgicas, como também nas jurídicas-pastorais, o Concílio foi um outro momento de aprofundamento e de atualização da rica herança teológica-espiritual da Igreja na sua história bimilenar. Com o Motu Proprio, o Papa quis afirmar claramente que toda tentação de desprezo dessas veneráveis tradições está fora de lugar. A Mensagem é clara: progresso, sim, mas não às custas, ou sem a história. Também a reforma litúrgica deve ser fiel a tudo aquilo que aconteceu desde o início até hoje, sem exclusões.

Por outro lado, não devemos jamais esquecer que, para a Igreja Católica, a Revelação Divina não é algo proveniente apenas da Sagrada Escritura, mas também da Tradição viva da Igreja. Tal fé nos distingue nitidamente das outras manifestações da fé cristã. A verdade para nós é aquilo que emerge, por assim dizer, destes dois pólos, isto é, a Sagrada Escritura e a Tradição. Esta posição, para mim, é muito mais rica do que outras visões, porque respeita a liberdade do Senhor a guiar-nos em direção a uma compreensão mais adequada da verdade revelada também através daquilo que acontecerá no futuro. Naturalmente, o processo de discernimento daquilo que emerge será atualizado através do Magistério da Igreja. Mas aquilo que devemos recolher é a importância atribuída à Tradição. A Constituição Dogmática Dei Verbum afirmou essa verdade claramente (DV 10).

Ademais, a Igreja é uma realidade que supera os níveis de uma pura invenção humana. Ela é o Corpo místico de Cristo, a Jerusalém celeste e a estirpe eleita de Deus. Ela, por isso, supera as fronteiras terrestres assim como toda limitação de tempo e é uma realidade que transcende de muito a sua manifestação terrestre e hierárquica. Por isso, nela, aquilo que é recebido, deverá ser transmitido fielmente. Nós não somos nem inventores da verdade, nem os seus donos, mas apenas aqueles que a recebem, e que têm o dever de protegê-la e transmiti-la aos outros. Como dizia São Paulo falando da Eucaristia: “Eu de fato recebi do Senhor aquilo que, por minha vez, vos transmiti” (1Cor 11, 23). O respeito da Tradição não é, portanto, uma livre escolha nossa na busca da verdade, mas a sua base que deve ser aceita. Na Igreja, a fidelidade à Tradição, por isso, é uma atitude essencial da própria Igreja. O Motu Proprio, a meu ver, deve ser entendido também nesse sentido. Ele é um possível estímulo para uma necessária correção de rumo. De fato, em algumas escolhas da reforma litúrgica feita depois do Concílio, foram adotadas orientações que ofuscaram alguns aspetos da Liturgia, melhor refletida da prática precedente, porque, a renovação litúrgica foi entendida por alguns como algo a ser feito totalmente “ex novo” (do novo). Sabemos bem, porém, que tal não foi a intenção da Sacrosanctum Concilium, que destaca que “as novas formas, de qualquer modo, desabrocharão organicamente daquelas já existentes” (SC 23).

Uma característica do Pontificado de Bento XVI parece ser a insistência em torno de uma correta hermenêutica do Concílio Vaticano II. Segundo o Senhor, o Motu Proprio "Summorum Pontificum" vai nessa direção? Se sim, em que sentido?

"Já quando era Cardeal, em seus escritos, o Papa havia rejeitado um certo espírito de exuberância visível em alguns círculos teológicos motivados por um assim chamado "espírito do Concílio" que para ele foi, na realidade, um verdadeiro "anti espírito" ou um "Konzils-Ungeist" (Relação sobre a Fé, São Paulo, 2005, capítulo 2). Cito textualmente tal obra na qual o Papa sublinha: "É preciso opor-se decisivamente a esse esquematismo de um antes e um depois na história da Igreja, totalmente injustificado pelos próprios documentos do Vaticano II, que não fazem senão reafirmar a continuidade do catolicismo" (ibid p. 33).

Ora, um tal erro de interpretação do Concílio e do caminho histórico-teológico da Igreja influiu sobre todos os setores eclesiásticos, inclusive na Liturgia. Uma certa atitude, de fácil rejeição dos desenvolvimentos eclesiológicos e teológicos, como também dos comportamentos litúrgicos do último milênio, de um lado, e uma ingênua idolização do que teria sido a “mens” da Igreja assim chamada dos primeiros cristãos, de outro lado, teve um influxo de não pouca importância sobre a reforma litúrgico-teológica da era pós conciliar.

A rejeição categórica da Missa pré-conciliar, como o resto de uma época já “superada”, foi o resultado dessa mentalidade. Tantos viram as coisas desse modo, mas, por graça de Deus, não por todos.A própria Sacrosanctum Concilium, a Constituição Conciliar sobre a Liturgia, não oferece nenhuma justificação para tal atitude. Seja em seus princípios gerais, seja em suas normas propostas, o Documento é sóbrio e fiel àquilo que significa a vida litúrgica da Igreja. Basta ler o número 23 do dito documento para sermos convencidos de tal espírito de sobriedade.

Algumas dessas reformas abandonaram importantes elementos da Liturgia com as relativas considerações teológicas: agora é necessário e importante recuperar esses elementos. O Papa, considera que o rito de São Pio V, revisto pelo Beato João XXIII, é um caminho para a recuperação daqueles elementos ofuscados pela reforma, o Papa deve certamente ter refletido muito sobre sua escolha; sabemos que ele consultou diversos setores da Igreja sobre tal questão e, não obstante algumas posições contrárias, o Papa decidiu permitir a livre celebração daquele Rito. Tal decisão não é tanto, como dizem alguns, um retorno ao passado, quanto a necessidade de tornar a equilibrar de modo íntegro os aspetos eternos, transcendentes e celestiais com os terrestres e comunitários da Liturgia. Essa decisão ajudará a estabelecer eventualmente um equilíbrio também entre o sentido do sagrado e do mistério, de um lado, e o dos gestos externos e dos comportamentos e empenhos sócio-culturais derivantes da Liturgia”.

Quando ainda era Cardeal, Joseph Ratzinger insistia muito sobre a necessidade de ler o Concílio Vaticano II a partir de seu primeiro documento, isto é, da Sacrosanctum Concilium. Por que, conforme o Senhor, os Padres Conciliares quiseram dedicar-se antes de tudo à Liturgia?

Antes de tudo, por trás dessa escolha, estava seguramente a consciência da importância vital da Liturgia para a Igreja. A Liturgia, por assim dizer, é o olho do furacão, porque aquilo que se celebra, é aquilo que se crê e aquilo que se vive: o famoso axioma Lex orandi, lex credendi. Por isso, toda verdadeira reforma da Igreja passa através da Liturgia. Os Padres estavam cônscios de tal importância. Ademais, a reforma litúrgica era um processo já em ação antes mesmo do Concílio a partir sobretudo do Motu Proprio Tra le Sollecitudini de São Pio X e da Mediator Dei de Pio XII.

Foi São Pio X que atribuiu à Liturgia a expressão “primeira fonte” do autêntico espírito cristão. Talvez já, também, a existência das estruturas e da experiência de quem se empenhava para o estudo e a introdução de algumas reformas litúrgicas, estimulava os Padres Conciliares a escolher a Liturgia como matéria a considerar como a primeira nas sessões do Concílio. O Papa Paulo VI refletia a mente dos Padres Conciliares sobre a questão, quando disse: “nós aí vemos o obséquio da escala dos valores e deveres: Deus em primeiro lugar; a oração primeira obrigação nossa; a Liturgia primeira fonte da vida divina comunicada a nós, primeira escola da nossa vida espiritual, primeiro dom que podemos dar ao povo cristão…” (Paulo VI, Discurso de encerramento do 2° período do Concílio, 4 de Dezembro de 1963).

Muitos leram a publicação do Motu Proprio “Summorum Pontificum” como uma vontade do Pontífice para aproximar a Igreja dos cismáticos lefebvrianos. Segundo o senhor, foi isso mesmo? Vai também nesse sentido o Motu Proprio?

Sim, mas não só assim. O Santo Padre explicando as motivações de sua decisão, seja no texto do Motu Proprio como na carta de apresentação escrita para os Bispos, elenca também outras razões importantes. Naturalmente, ele terá levado em conta o pedido sempre mais crescente, feito por diversos grupos e, sobretudo, pela Sociedade de São Pio X e a Fraternidade Sacerdotal de São Pedro, assim como também por Associações de Leigos, para a liberalização da Missa de São Pio V. Assegurar a integração total dos Lefebvrianos era importante também pelo fato de que muitas vezes, no passado, se cometeram erros de julgamento causando inúteis divisões na Igreja, divisões que agora se tornaram quase insuperáveis. O Papa fala desse possível perigo na carta de apresentação do Documento escrita aos Bispos.

Quais são, a seu ver as problemáticas mais urgentes para a justa celebração da Sagrada Liturgia? Quais as instâncias sobre as quais se deveria insistir mais?

"Creio que nos crescentes pedidos para a liberalização da Missa de São Pio V, o Papa tenha visto sinais de um certo esvaziamento espiritual causado pelo modo com o qual os momentos litúrgicos, são até hoje celebrados na Igreja. Tal dificuldade nasce tanto de certas orientações da reforma litúrgica pós conciliar, que tendiam a reduzir, ou melhor ainda, a confundir aspetos essenciais da fé, quanto de comportamentos aventureiros e pouco fiéis à disciplina litúrgica da própria reforma; o que se constata por toda a parte.

Creio que uma das causas para o abandono de alguns elementos importantes, do rito tridentino na realização da reforma pós conciliar por parte de certos setores litúrgicos seja o resultado de um abandono ou de uma sub avaliação daquilo que teria acontecido no segundo milênio da história da Liturgia. Alguns liturgistas viam os desenvolvimentos desse período de um modo antes negativo. Tal juízo é errôneo porque quando se fala da tradição viva da Igreja não se pode escolher aqui e acolá aquilo que concorda com nossas idéias pré concebidas. A Tradição, considerada em um sentido geral também nos ambientes da ciência, filosofia, ou teologia, é sempre algo vivo que continua a se desenvolver e a progredir também nos momentos altos e baixos da história. Para a Igreja, a Tradição viva é uma das fontes da revelação divina e é fruto de um processo de evolução continua. Isso é verdade também na tradição litúrgica, com o “t” minúsculo. Os desenvolvimentos da Liturgia no segundo milênio têm o seu valor. A Sacrosanctum Concilium não fala de um novo Rito, ou de um momento de ruptura, mas de uma reforma que surja organicamente daquilo que já existe. É por isso que o Papa diz: “na história da Liturgia há crescimento e progresso, mas não há nenhuma ruptura. Aquilo que para as gerações anteriores era sagrado, também para nós permanece sagrado e grande, e não pode ser improvisamente totalmente proibido ou, sem mais, considerado nocivo” (Carta aos Bispos, 7 de Julho de 2007). Idolatrar aquilo que aconteceu no primeiro Milênio, com prejuízo do que ocorreu em sucessivo, é, pois, uma atitude pouco científica. Os Padres Conciliares não mostraram um tal comportamento.

Uma segunda problemática seria aquela de uma crise de obediência para com o Santo Padre que se nota em alguns ambientes. Se tal atitude de autonomia é visível entre alguns eclesiásticos, como também nos níveis mais altos da Igreja, não favorece certamente à nobre missão que Cristo confiou a seu Vigário.

Ouve-se que, em algumas nações ou dioceses, foram promulgadas pelos Bispos regras que praticamente anulam ou deformam a intenção do Papa. Tal comportamento não é consoante com a dignidade e a nobreza da vocação de um pastor da Igreja. Não digo que todos sejam assim. A maioria dos Bispos e eclesiásticos aceitaram, com o devido sentido de reverência e de obediência, a vontade do Papa. Isso é verdadeiramente louvável. Entretanto, houve vozes de protesto por parte de alguns Bispos.

Ao mesmo tempo, não se pode ignorar que tal decisão foi necessária porque, como diz o Papa, a Santa Missa: “em muitos lugares se celebrava de modo fiel às prescrições do novo Missal, mas isso era, sem mais, entendido como uma autorização e até como uma obrigação para a criatividade, a qual leva freqüentemente a deformações da liturgia até o limite do suportável”. “Falo por experiência”, continua o Papa “porque vivi também eu aquele período com todas as suas expectativas e confusões e vi como pessoas que eram totalmente radicadas na Fé da Igreja, quão profundamente elas foram feridas pelas deformações arbitrárias da Liturgia,” (Carta aos Bispos). O resultado de tais abusos foi um crescente espírito de nostalgia para com a Missa de São Pio V. Além disso, um sentido de desinteresse geral para ler e respeitar seja os documentos normativos da Santa Sede, como também as próprias Instruções e Premissas dos livros litúrgicos piorou ainda mais a situação. A Liturgia não parece ainda figurar suficientemente na lista das prioridades para os Cursos de Formação continua dos eclesiásticos.

Distingamos bem. A reforma pós conciliar não é de todo negativa; antes, há nela muitos aspetos positivos naquilo que foi realizado. Mas há também mudanças introduzidas abusivamente que continuam a ser levadas avante não obstante seus efeitos nocivos à fé e sobre a vida litúrgica da Igreja.

Falo aqui, por exemplo, de uma mudança efetuada na reforma, a qual não foi proposta nem pelos Padres Conciliares, nem pela Sacrosanctum Concilium, isto é, a comunhão recebida na mão. Isso contribuiu, de algum modo, para uma certa decadência da fé na Presença real de Cristo na Eucaristia. Essa prática, e a abolição das balaustradas do presbitério, dos genuflexórios das igrejas e a introdução de práticas que obrigam os fiéis a ficar sentados ou de pé durante a elevação do Santíssimo Sacramento reduze, o genuíno significado da Eucaristia assim como o sentido da profunda adoração que a Igreja deve dirigir para o Senhor, o Unigênito Filho de Deus. Além disso, a Igreja, casa de Deus, em alguns lugares é usada como sala para encontros fraternos, concertos ou celebrações inter-religiosas. Em algumas Igrejas , o Santíssimo Sacramento é quase escondido e abandonado em uma capelinha invisível e pouco decorada. Tudo isso obscurece a fé tão central da Igreja, na presença real de Cristo. Para nós católicos, a Igreja é essencialmente a casa do eterno.

Outro sério erro é aquele de confundir os papéis específicos do clero e dos leigos com relação ao altar tornando o presbitério um lugar de perturbação, de excessivo movimento, e não certamente “o lugar” onde o cristão consegue colher o sentido de estupor e de esplendor ante a presença e a ação salvífica do Senhor. O uso de danças, de instrumentos musicais e de cantos que têm bem pouco de litúrgico, não são de modo algum consoantes ao ambiente sagrado da Igreja e da Liturgia; acrescento também certas homilias de caráter político-social frequentemente pouco preparadas. Tudo isso desnatura a celebração da S. Missa e faz dela uma coreografia e uma manifestação de teatralidade, mas não de fé.

Há ainda outros aspetos pouco coerentes com a beleza e a maravilha daquilo que se celebra sobre o altar. Nem tudo vai mal com o Novus Ordo, mas muitas coisas ainda devem ser colocadas em ordem evitando ulteriores danos à vida da Igreja. Creio que nossa atitude com relação ao Papa, para com as suas decisões e a expressão de sua solicitude para o bem da Igreja deve ser somente aquela que São Paulo recomendou aos Coríntios - “mas tudo se faça para a edificação” (1Cor 14, 26). (P.L.R.) (Agência Fides 16/11/2007; 199 linhas, 2.742 palavras)

[Destaques do autor da postagem]

Tradução: Montfort
Fonte: Agência FIDES - http://www.fides.org/aree/news/newsdet.php?idnews=14580&lan=ita

Cartas sobre a Fé - Introdução

Por Pe. Emmanuel-André.


Em nosso século (XIX), falou-se e fala-se muito de «instrução» e mesmo de «instrução pública», assim como de «instrução obrigatória».

Mas há um ponto essencial sobre o qual o mais freqüente é não ter ele merecido mais do que uma atenção superficial. Não se indaga, antes de tudo, a quem se teria de ensinar.

Isso no entanto valeria a pena, pois geralmente, senão universalmente, as pessoas a quem devemos ensinar são pessoas batizadas.

Pessoas batizadas! O que quer isto dizer? Quer dizer que uma criança batizada, tendo recebido de Deus na ocasião de seu batismo graças que modificaram poderosamente as condições de sua inteligência, é preciso ter este fato em consideração quando se deseja falar a essa inteligência assim modificada. Deus tendo pelo batismo incutido na alma da criança o «hábito» da fé[1], daí decorre infalivelmente esta alma ter uma inclinação muito forte para as verdades da fé e uma necessidade premente de recebê-las para assimila-las, nutrir-se delas e passar, na fé, do hábito ao ato.

E esta deve ser a regra invariável da instrução, seja na família, seja nas escolas, não importa quão superiores ou famosas elas sejam.

O cristão é sempre cristão, o batizado sempre um batizado; e sempre um filho de Deus aspira conhecer seu Pai que está nos Céus.

Se antes de tudo entregarem à criança o alimento que ela reclama, verão sua inteligência, se bem que ainda em plena aurora, regozijar-se com uma alegria maravilhosa e logo depois desenvolver-se e desabrochar. Pois se o homem terrestre vive de pão, o homem inteligente e cristão vive da verdade.

Se, ao contrário, pouco se preocupando com as várias necessidades da criança, não tiverem para entregar-lhe senão frias nomenclaturas ou definições gramaticais, que ela não compreenderá senão dez anos mais tarde, ou talvez nunca, acontecerá infalivelmente isto: enganada no que almeja, frustrada em suas aspirações mais legítimas e mais santas, a inteligência da criança se entorpecerá, se estiolará; e, acometida de uma espécie de tísica sui generis, ela forçará os senhores professores das escolas primárias a constatar que o nível intelectual vai sempre baixando. Isso é notório, infelizmente. Pode-se saber ler e escrever. Mas não se sabe nem pensar o que se escreve, nem julgar o que se lê. Verdadeira carência intelectual.

Mães cristãs, querem evitar semelhantes desgraças a seus filhos queridos? Trabalhem para consegui-lo. Nós lhes ajudaremos. De início diremos que há três maneiras ou métodos de ensinar religião:
  • O primeiro seria o método que iria de sua memória à memória de seu filho;
  • O segundo que se originaria de sua inteligência indo à inteligência dele;
  • O terceiro, enfim, de sua fé à fé dele.
O primeiro método reina em muitas escolas, o segundo igualmente; o terceiro é hoje o privilégio quase exclusivo, e grande honra, das mães cristãs.

O método que nós chamamos «da memória» é um método fácil. Hoje se deseja que tudo seja fácil; mas sem dúvida este é o método necessário para a instrução do animal. Há animais ensinados. Aplicado ao cristão, este método é consideravelmente depreciativo para sua alma. Para o cristão, o espírito é o ponto importante da alma, é a sua cidadela interior. É onde deve reinar a verdade: agora pela fé, no Céu pela visão de Deus. É, portanto, ao espírito da criança que é preciso visar. Se se dirigirem só à sua memória; se ensinarem à criança o Catecismo como ensinam a Gramática; se fizerem recitar a História Sagrada igual a Geografia, podem não ter feito mais do que constatar se sua memória reteve fielmente o que leu no livro. Terão praticado grande dano a seu espírito que, não recebendo o alimento e o estímulo que lhe são indispensáveis, se abaterá e cairá de inanição.

O segundo método é muito superior ao precedente, ao menos vai de inteligência a inteligência. Uma pessoa que sabe, dirige-se à criança para ensinar-lhe. Este segundo método força a inteligência da criança a trabalhar e a habitua a raciocinar e lhe faz sentir o poder de uma demonstração. Com tudo isso, porém, este método não poderá fazer senão pessoas instruídas, pois não atende a todas as necessidades de um batizado. Se à força de querer ensinar ciência ao aluno esquecerem as aspirações de sua alma cristã; se não trabalharem para vivificar a fé de seu batismo, os tesouros depositados na alma pelo Batismo, pela Confirmação, pela Eucaristia irão se consumindo e um dia, finalmente, o homem que foi instruído por vocês deixará de crer. Não se diz que muitos homens perderam a fé estudando, e até estudando teologia? Portanto, embora este método possa produzir eruditos, é insuficiente, pois não forma crentes. Se o primeiro método prejudica a inteligência, o segundo prejudica a fé.

Precisam então, ó mães cristãs, sem negligenciar a memória, sem negligenciar todos os recursos de suas inteligências e da de seus filhos, precisam de um método mais poderoso, mais seguro, mais adaptado ao fim a que se propõem. Será o método que vai direto, já dissemos, da sua fé à fé de seu filho. Sua inteligência de batizado reclama algo que todos os livros do mundo não lhe poderiam dar. «A letra mata», diz São Paulo, em sua linguagem divinamente enérgica. A esta querida alma batizada é preciso fazer compreender aquilo que o mesmo São Paulo chama de «verbum fidei», a palavra da fé. Um hebraísmo, é verdade, mas que em português quer dizer: A fé falada. A fé falada! Sim, eis aí, mãe cristã, o leite espiritual que seu filho pede. Dê-lhe, seja mãe por inteiro e não babá. A criança pede em primeiro lugar a palavra e não o livro, o livro virá a seu tempo. Mas se crerem, ó mães, falem de sua fé aos seus filhos; eles são batizados e portanto aptos a lhes escutar; eles acreditarão, pela graça de seu batismo e sua alma dirá: «Tenho meu pão, eu vivo».

Continua...


[1] Pe. Emmanuel emprega a palavra hábito no sentido filosófico de habitus, que significa: disposição estável [N. da P.]

AUDIÊNCIA GERAL - São Jerônimo (Parte I)

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Continuando a série de catequese do Papa sobre a vida dos santos.
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PAPA BENTO XVI

AUDIÊNCIA GERAL

Quarta-feira, 7 de Novembro de 2007

São Jerónimo

Queridos irmãos e irmãs!

Detemos hoje a nossa atenção sobre São Jerónimo, um Padre da Igreja que colocou no centro da sua vida a Bíblia: traduziu-a em língua latina, comentou-a nas suas obras, e sobretudo empenhou-se em vivê-la concretamente na sua longa existência terrena, não obstante o conhecido carácter difícil e impetuoso que recebeu da natureza.

Jerónimo nasceu em Strídon por volta de 347 de uma família cristã, que lhe garantiu uma cuidadosa formação, enviando-o também a Roma para aperfeiçoar os seus estudos. Desde jovem sentiu atracção pela vida mundana (cf. Ep. 22, 7), mas prevaleceram nele o desejo e a intercessão pela religião cristã. Tendo recebido o baptismo por volta de 336, orientou-se para a vida ascética e, tendo ido a Aquileia, inseriu-se num grupo de cristãos fervorosos por ele definido quase "um coro de beatos" (Chron. ad ann. 374) reunido em volta do Bispo Valeriano. Partiu depois para o Oriente e viveu como eremita no deserto de Calcide, a sul de Alepo (cf. Ep. 14, 10), dedicando-se seriamente aos estudos. Aperfeiçoou o seu conhecimento do grego, iniciou o estudo do hebraico (cf. Ap. 125, 12), transcreveu códices e obras patrísticas (cf. Ep. 5, 2). A meditação, a solidão, o contacto com a Palavra de Deus fizeram amadurecer a sua sensibilidade cristã. Sentiu mais incómodo o peso dos anos juvenis (cf. Ep. 22, 7), e advertiu vivamente o contraste entre mentalidade pagã e vida cristã: um contraste que se tornou célebre pela "visão" dramática e vivaz, da qual nos deixou uma narração. Nela pareceu-lhe ser flagelado diante de Deus, porque "ciceroniano e não-cristão" (cf. Ep 22, 30).

Em 382 transferiu-se para Roma: aqui o Papa Dâmaso, conhecendo a sua fama de asceta e a sua competência de estudioso, assumiu-o como secretário e conselheiro; encorajou-o a empreender uma nova tradução latina dos textos bíblicos por motivos pastorais e culturais. Algumas pessoas da aristocracia romana, sobretudo fidalgas como Paula, Marcela, Asella, Lea e outras, desejosas de se empenharem no caminho da perfeição cristã e de aprofundarem o seu conhecimento da Palavra de Deus, escolheram-no como sua guia espiritual e mestre na abordagem metódica aos textos sagrados. Estas fidalgas aprenderam também grego e hebraico.

Depois da morte do Papa Dâmaso, Jerónimo deixou Roma em 385, e empreendeu uma peregrinação, primeiro à Terra Santa, testemunha silenciosa da vida terrena de Cristo, depois ao Egipto, terra de eleição de muitos monges (cf. Contra Rufinum 3, 22; Ep. 108, 6-14). Em 386 permaneceu em Belém onde, por generosidade da fidalga Paula, foram construídos um mosteiro masculino, um feminino e uma estalagem para os peregrinos que iam à Terra Santa, "pensando que Maria e José não tinham encontrado onde repousar" (Ep. 108, 14). Permaneceu em Belém até à morte, continuando a desempenhar uma intensa actividade: comentou a Palavra de Deus; defendeu a fé, opondo-se vigorosamente a várias heresias; exortou os monges à perfeição; ensinou a cultura clássica e cristã a jovens alunos; acolheu com alma pastoral os peregrinos que visitavam a Terra Santa. Faleceu na sua cela, perto da gruta da Natividade, a 30 de Setembro de 419/420.

A preparação literária e a ampla erudição permitiram que Jerónimo fizesse a revisão e a tradução de muitos textos bíblicos: um precioso trabalho para a Igreja latina e para a cultura ocidental. Com base nos textos originais em grego e em hebraico e graças ao confronto com versões anteriores, ele realizou a revisão dos quatro Evangelhos em língua latina, depois o Saltério e grande parte do Antigo Testamento. Tendo em conta o original hebraico e grego, dos Setenta, a versão grega clássica do Antigo Testamento que remontava ao tempo pré-cristão, e as precedentes versões latinas, Jerónimo, com a ajuda de outros colaboradores, pôde oferecer uma tradução melhor: ela constitui a chamada "Vulgata", o texto "oficial" da Igreja latina, que foi reconhecido como tal pelo Concílio de Trento e que, depois da recente revisão, permanece o texto "oficial" da Igreja de língua latina. É interessante ressaltar os critérios aos quais o grande biblista se ateve na sua obra de tradutor. Revela-o ele mesmo quando afirma respeitar até a ordem das palavras das Sagradas Escrituras, porque nelas, diz, "até a ordem das palavras é um mistério" (Ep. 57, 5), isto é, uma revelação. Reafirma ainda a necessidade de recorrer aos textos originários: "Quando surge um debate entre os Latinos sobre o Novo Testamento, para as relações discordantes dos manuscritos, recorremos ao original, isto é, ao texto grego, no qual foi escrito o Novo Pacto. Do mesmo modo para o Antigo Testamento, se existem divergências entre os textos gregos e latinos, apelamos ao texto original, o hebraico; assim tudo o que brota da nascente, podemo-lo encontrar nos ribeiros" (Ep. 106, 2). Além disso, Jerónimo comentou também muitos textos bíblicos. Para ele os comentários devem oferecer numerosas opiniões, "de modo que o leitor cauteloso, depois de ter lido as diversas explicações e conhecido numerosas opiniões para aceitar ou rejeitar julgue qual seja a mais fidedigna e, como um perito de câmbios, rejeite a moeda falsa" (Contra Rufinum 1, 16).

Contestou enérgica e vivazmente os hereges que recusavam a tradição e a fé da Igreja. Demonstrou também a importância e a validade da literatura cristã, que se tornou uma verdadeira cultura já digna de ser posta em confronto com a clássica: fê-lo compondo o De viris illustribus, uma obra na qual Jerónimo apresenta as biografias de mais de uma centena de autores cristãos. Escreveu também biografias de monges, ilustrando ao lado de outros percursos espirituais também o ideal monástico; traduziu também várias obras de autores gregos. Por fim, no importante Epistolário, uma obra-prima da literatura latina, Jerónimo sobressai com as suas características de homem culto, de asceta e de guia das almas.

Que podemos nós aprender de São Jerónimo? Sobretudo, penso, o seguinte: amar a Palavra de Deus na Sagrada Escritura. Diz São Jerónimo: "Ignorar as Escrituras é ignorar Cristo". Por isso é importante que cada cristão viva em contacto e em diálogo pessoal com a palavra de Deus, que nos é dada na Sagrada Escritura. Este nosso diálogo com ela deve ter sempre duas dimensões: por um lado, deve ser um diálogo realmente pessoal, porque Deus fala com cada um de nós através da Sagrada Escritura e cada um tem uma mensagem. Devemos ler a Sagrada Escritura não como palavra do passado, mas como Palavra de Deus que se dirige também a nós e procurar compreender o que o Senhor nos quer dizer. Mas para não cair no individualismo devemos ter presente que a Palavra de Deus nos é dada precisamente para construir comunhão, para nos unir na verdade no nosso caminho para Deus. Portanto, ela, mesmo sendo sempre uma palavra pessoal, é também uma Palavra que constrói comunidade, que constrói a Igreja. Por isso, devemos lê-la em comunhão com a Igreja viva. O lugar privilegiado da leitura e da escuta da Palavra de Deus é a liturgia, na qual, celebrando a Palavra e tornando presente no Sacramento o Corpo de Cristo, actualizamos a Palavra na nossa vida e tornámo-la presente entre nós. Nunca devemos esquecer que a Palavra de Deus transcende os tempos. As opiniões humanas vão e voltam. O que hoje é muito moderno, amanhã será velho. A Palavra de Deus, ao contrário, é Palavra de vida eterna, tem em si a eternidade, ou seja, é válida para sempre. TrazendoemnósaPalavrade Deus, trazemos também em nós o eterno, a vida eterna.

E concluo com uma palavra de São Jerónimo a São Paulino de Nola. Nela o grande exegeta expressa precisamente esta realidade, isto é, que na Palavra de Deus recebemos a eternidade, a vida eterna. Diz São Jerónimo: "Procuremos aprender na terra aquelas verdades cuja consistência persistirá também no céu" (Ep. 53, 10).



Fonte:
http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/audiences/2007/documents/hf_ben-xvi_aud_20071107_po.html

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Próxima reunião

Próxima reunião marcada

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Data: 02.12.2007 (Domingo)

Hora: 10h manhã

Local: Sala de reuniões da ICM
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Serão tratados vários temas:
- resultados da palestra de Chrisma na Paróquia Cristo Libertador;
- Encaminhamentos e discussões sobre a Missa Tridentina
em Manaus;
- Estudo sobre: história, formação, leitura e interpretação da Bíblia.
- Próximos eventos.


Contamos com a presença de todos.

Salve Maria!

domingo, 11 de novembro de 2007

Missa Tridentina em breve...

Salve Maria!

Em breve em Manaus: Missa Tridentina, a Missa de Sempre.

Aguardem!!!

"Podemos dizer que a Missa é "o altar em que temos o poder de comer" (Heb13); "o trono em que está o Cordeiro de pé e, ao mesmo tempo, imolado" (Apc 5), e que, nos nossos altares, continua o verdadeiro sacrifício instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo."

Catecismo da Santa Missa.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Próxima reunião... 11/11/2007 (Domingo)

Pessoal pedimos desculpas pelos tantos adiamentos e reuniões que não aconteceram.
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Próxima reunião marcada (CONFIRMADA)

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Data: 11.11.2007 (Domingo)

Hora: 10h manhã

Local: Sala de reuniões da ICM
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Serão tratados vários temas: próximos estudos, Missa Tridentina, palestras, etc.

Contamos com a presença de todos.

Salve Maria!

domingo, 4 de novembro de 2007

A SUBSTÂNCIA DO AMOR


Por Hugo de São Vitor.


1. Introdução Os dois rios do amor.
Semeamos cotidianamente um sermão sobre o amor para que possa faiscar e acender-se em nossos corações aquele fogo que produz a chama que tudo consome e tudo purifica.
Tudo o que é bom o é pelo amor, e tudo o que é mau o é também pelo amor.Uma só é a fonte do amor que, subindo do interior, derrama-se em dois rios: um destes rios é a cobiça, o amor do mundo; o outro é a caridade, o amor de Deus.Entre ambos estes rios está o coração do homem, de onde jorra a fonte do amor.Quando este se derrama pelo apetite às coisas exteriores, é chamado de cobiça; quando o seu desejo, porém, se dirige às coisas interiores, é denominado de caridade.
Há, portanto, dois rios que emanam da fonte do amor, a cobiça e a caridade, e a cobiça é a raiz de todos os males, enquanto que a caridade é a raiz de todos os bens.É pelo amor que tudo o que é bom é bom e é pelo amor que tudo o que é mau é mau.O que quer que seja o amor, portanto, coisa grande é quando está em nós.Por ele é tudo o que há em nós: isto é o amor.
O que é o amor, quão grande é o amor, e onde está o amor? A Palavra de Deus fala de amor.Não vos parece, porém, que este assunto pertença mais propriamente aos que costumam prostituir o seu pudor? Eis quantos são os que abraçam prontamente o seu ministério, e eis quão poucos são os que não se envergonham de falar abertamente de suas palavras! Que fazemos nós, portanto? Teríamos talvez tão pouco pudor que não nos envergonhamos de proclamar este amor que até os impúdicos às vezes não conseguem exprimi-lo sem vergonha?
Mas uma coisa, porém, é investigar o vício para que seja erradicado; outra exortar ao vício, para que a virtude e a verdade não sejam amadas.Nós investigamos e buscamos conhecer o que há em nós que divide de tantas maneiras nossos desejos e conduz um só coração a coisas tão diversas para que, conhecendo-o, possamos nos precaver, enquanto que eles investigam este mesmo assunto também para conhecê-lo, mas para que, conhecendo-o, possam não se precaver, mas praticá-lo.Esta coisa nada mais é do que o amor o qual, sendo um movimento do coração singular e único segundo a sua natureza, é, todavia, segundo a ação, dividido, pois quando se move desordenadamente, isto é, ao que não deve, é dito cobiça; quando, porém, o faz ordenadamente, é chamado de caridade.
Com que definição poderá ser significado este movimento do coração ao qual chamamos de amor? É importante que nós o examinemos adequadamente, para que nada dele fique escondido e desconhecido e, para que, por este motivo, não seja evitado sendo mau e não seja apetecido sendo bom, justamente este amor do qual, sendo mau, procedem tantos males e do qual, sendo bom, procedem tantos bens.
2. O que é o amor.
Como definiremos o amor? Investiguemos, consideremos, porque é oculto o que se busca e quanto mais interiormente estiver colocado tanto mais dominará em todas as partes do coração.
Isto, portanto, parece ser o amor: uma deleitação de um coração a algo por causa de algo, que é desejo ao apetecer, gozo ao fruir, que corre pelo desejo e repousa pelo gozo.Por ele o coração humano é bom, e por ele também o coração humano é mau; pois nem de outro modo será bom, se é bom, nem de outro modo será mau, se é mau, senão porque bem ou mal amamos o que é bom.Tudo o que é, é bom, mas quando aquilo que é bom é mal amado, isto não é bom e é mau.Nem quem ama é mau, nem o que é amado é mau, nem o amor pelo qual se ama é mau, mas amar mal é mau e nisto consiste todo o mal. Ordenai, pois, a caridade, e já não haverá mais nenhum mal.
3. O plano de Deus.
Grande coisa queremos recomendar, se todavia pudermos o que queremos. Deus onipotente, que de nada necessita, porque Ele é o sumo e verdadeiro bem, o qual nem pode receber de outrem algo pelo qual cresça, já que todas as coisas provém dEle, nem pode perder algo do que é seu pelo qual venha a morrer, já que nEle imutavelmente consistem todas as coisas, Ele mesmo criou o espírito racional apenas pela caridade, movido por nenhuma necessidade, para que o fizesse participante de sua própria bem aventurança.
Para que ele, porém, fosse capaz de fruir de tanta bem aventurança, fêz nele o amor espiritual, um certo paladar do coração pelo qual este fosse sensibilizado ao gosto da doçura interior, na medida em que por este amor saboreasse a alegria de sua felicidade e a Ele inerisse por um infatigável desejo.Pelo amor, portanto, Deus uniu a si a criatura racional para que, sempre inerindo a Ele, dEle sugasse de algum modo pelo afeto o próprio bem pelo qual seria beatificado, dEle o bebesse pelo desejo e nEle o possuísse pelo gozo.
Suga, ó pequena abelha, suga; suga e bebe a inenarrável suavidade de tua doçura.Submerge-te e plenifica-te, porque Ele não pode falhar se tu não começares a te enfastiar.Adere e inere, toma e frui; se o gosto for sempiterno, sempiterna será também a bem aventurança.
Não nos envergonhemos e não nos arrependamos de ter feito esta palavra de amor; não nos arrependamos de onde procede tanta utilidade, não nos envergonhemos de onde procede tanta honestidade.
4. Os dois cordéis da caridade.
A criatura racional, portanto, une-se ao seu Criador pelo amor, e só há este vínculo de amor que liga nele a ambos, vínculo tanto mais feliz quanto mais forte.
Por este motivo, para que a indivisa sociedade e concórdia também fossem perfeitas, há um duplo cordel na caridade de Deus e do próximo, para que pela caridade de Deus todos co-inerissem a um só, e pela caridade do próximo todos se fizessem mutuamente um só.Deste modo, o que alguém em si mesmo não entenda deste um só ao qual todos inerem, mais plena e perfeitamente poderá possuí-lo no outro pela caridade do próximo, e assim o bem de todos pode-se tornar o todo de cada um.Ordenai, portanto, a caridade.
O que significa `ordenai a caridade'? Significa que, se o amor é desejo, que corra bem; se é gozo, que repouse bem.O amor, de fato, conforme já foi dito, é a deleitação de um coração a algo por causa de algo, desejo ao apetecer e gozo ao fruir, correndo pelo desejo e repousando pelo gozo, correndo a algo e nele repousando. Ao que, porém, e em que?
5. A ordenação da caridade.
Ouvi, se talvez o pudermos explicar, pelo que deve correr o nosso amor, ou em que deve repousar.
Três coisas há que podem ser amadas bem ou mal, isto é, Deus, o próximo e o mundo. Deus está acima de nós, o próximo está junto a nós, e o mundo está abaixo de nós. Ordenai, portanto, a caridade.Se corre, que corra bem; se repousa, que repouse bem.O desejo corre, o gozo repousa.Por este motivo o gozo é uniforme, porque sempre está em um só, nem pode variar pela vicissitude; o desejo, porém, recebe a mutabilidade do movimento e, portanto, não se contém em um só, mas apresenta várias espécies.
Toda corrida é ou daquilo que é, ou com ele ou para ele.Como, portanto, deve correr o nosso desejo? Existem três coisas, Deus, o próximo e o mundo.Deus pode ter três coisas na corrida de nosso desejo, o próximo pode ter duas e o mundo apenas uma.Deste modo pode haver caridade ordenada no desejo.
O amor pode correr ordenadamente pelo desejo de Deus, com Deus e a Deus.Corre pelo desejo de Deus, quando dEle recebe de onde o ame.Corre com Deus, quando em nada contradiz à sua vontade.Corre a Deus quando apetece nEle repousar.Estas são as três coisas que pertencem a Deus.
Já duas são do próximo.A caridade pode correr pelo desejo do próximo e com o próximo, mas não o pode ao próximo.Corre pelo desejo do próximo quando se alegra de sua salvação e de seu aproveitamento.Corre com o próximo quando na via de Deus o deseja como companheiro de caminho e como sócio em seu encontro.Mas não pode correr ao próximo, para que constitua no homem a sua esperança e confiança.Estas são as coisas que pertencem ao próximo; isto é, dele e com ele, mas não a ele.
Uma só coisa pertence ao mundo, que é correr recebendo dele; não com ele, nem a ele.O desejo, de fato, corre recebendo do mundo quando este, examinado como obra de Deus, pela admiração e pelo louvor nos converte mais ardentemente a Deus.O desejo correria com o mundo se o mundo, por causa da mutabilidade das coisas temporais, nos conformasse a si pelo desânimo na adversidade e pela elevação na prosperidade, e deste modo a ele nos tornássemos semelhantes.O desejo correria ao mundo se quisesse sempre repousar em seus prazeres.
Ordenai, portanto, a caridade, para que ela corra pelo desejo de Deus, com Deus e para Deus; pelo desejo do próximo, com o próximo mas não ao próximo; recebendo do mundo, mas não com ele e nem para ele, para que assim somente em Deus repouse pelo gozo.
Esta é a ordenada caridade, e fora dela tudo o que se faz não é caridade ordenada, mas cobiça desordenada.
6. O amor, vida do coração.
O amor é a vida do coração e, portanto, sem amor é inteiramente impossível que haja um coração que deseje viver.
Considera o que se segue daqui. Se, de fato, a mente humana não pode existir sem amor, é necessário que ame ou a si mesma ou a algo além de si mesma. Como, porém, em si mesma não pode encontrar o perfeito amor, se se amasse apenas a si mesma o amor feliz não existiria. É necessário, portanto, se desejamos amar com felicidade, que busquemos algo além de nós a que amemos.Se começarmos a amar, porém, algo imperfeito fora de nós, estimularemos em nós o amor, mas não excluiremos a nossa miséria. Ninguém amará, portanto, com felicidade, até que o seu desejo não se converta pelo amor ao verdadeiro e sumo bem. Como, porém, somente Deus é o verdadeiro e sumo bem, amará com felicidade apenas quem amar a Deus, e com tanta maior felicidade quanto mais amplamente o amar. Este, portanto, será o verdadeiro repouso de nosso coração, quando nos estabelecermos pelo desejo no amor de Deus, nem mais nada além dEle apetecermos mas, nEle já possuído, nos deleitarmos por uma feliz segurança.Como Ele não estende o apetite para além dEle, nem repele pelo temor, assim de certo modo nEle repousamos por uma felicidade sem vexação.
A enfermidade da mente humana porém, não direi sempre, mas algumas vezes, dificilmente pode fixar-se na doçura da divina contemplação.Por este motivo, enquanto não o consegue, deve ser acostumada por um certo estudo àquela estabilidade a qual ainda não é capaz de alcançar.Isto é, se não podemos pensar sempre em Deus, que pelo menos reprimamos nosso coração dos pensamentos ilícitos e vãos, para que o possuamos na consideração das suas obras e de suas maravilhas, até que, enquanto nos esforçarmos em ser sempre menos instáveis, finalmente, no-lo concedendo Deus, sejamos capazes de nos tornar verdadeiramente estáveis.
7. A fé, navio nas ondas deste mundo.
Procurarei oferecer-te um exemplo para que possas promover estas coisas. Todo este mundo é como um dilúvio, porque todas as coisas que estão neste mundo, à semelhança das águas, correm flutuando por eventos incertos.
Já a verdadeira fé, que não promete coisas transitórias, mas eternas, levanta a alma como que de certas ondas, erguendo-a da cobiça deste mundo às coisas do alto; ela pode então ser levada pelas águas, mas não pode ser inteiramente submergida, porque este mundo pode ser usado devido à necessidade, mas não pode obrigar o afeto.
Quem quer que, portanto, não crendo nas coisas eternas, somente apetece as que são transitórias, debate-se entre ondas como que sem navio, e o ímpeto das águas que correm o carregam consigo.Quem , porém, crendo nas eternas, ama as coisas transitórias, este é como aquele que naufragou perto de um navio.Já quem crê nos bens eternos e os ama, como que já colocado no navio, atravessa seguro as ondas do mar revolto.E se pelo desejo da fé não abandonar o navio, de certo modo, ainda que no meio das ondas, imita a estabilidade da terra.
Em primeiro lugar, portanto, se quisermos atravessar ilesos este grande mar, fabriquemos um navio, de tal maneira que tenhamos uma fé íntegra.Habitemos depois o navio da fé pela caridade, para que creiamos o que devemos amar e amemos o que cremos, de modo que assim tanto a lei de Deus esteja em nosso coração pelo reto conhecimento da fé como o nosso coração esteja na lei de Deus pelo amor.
Mas para que mais facilmente conheças como ou de onde deves edificar este navio ou arca em teu coração pelo qual, conduzido em meio ao naufrágio deste dilúvio, chegues ao porto da quietude, considera as duas obras de Deus que são a obra da criação e a obra da restauração.
A obra da criação é a criação do céu e da terra e de todas as coisas que neles estão contidas, as quais foram feitas em seis dias. Já a obra da restauração é a Encarnação do Verbo e todas as coisas que, desde o princípio do mundo até o seu fim, tanto a precederam para anunciá-la como a seguiram para confirmá-la.Estas todas se fizeram ao longo de seis idades.
A obra da restauração mais pertence à fé católica, a qual por isto é mais amada pelos santos, porque nela reconhecem os remédios para a sua salvação.Deus operou esta obra em parte pelos homens, em parte pelos anjos, em parte por si mesmo, de tal maneira que na arca espiritual a primeira morada são as obras dos homens, a segunda as obras dos anjos, a terceira as obras de Deus, e nela o supremo repouso é o próprio Deus, autor de todas.
Fonte: http://www.voltaparacasa.com.br/a_substancia_do_amor.htm

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