Como poderíamos conhecer os mistérios da salvação, que são essencialmente sobrenaturais,
sem a Fé na Revelação divina?
Nunca ensinaríamos demais esta doutrina fundamental, e para bem compreendê-la, é preciso considerar que há três ordens de conhecimento essencialmente distintas e subordinadas.
1. — Há primeiramente a ordem sensível, a dos corpos, das pedras, das plantas, dos animais, aquela onde se move o nosso corpo; conhecemos a realidade desta ordem pelos nossos sentidos. Ela tem a sua beleza: a das cores, a dos sons, a da harmonia.
2. — Acima, há a ordem racional, a das verdades acessíveis à razão. A esta ordem pertence a distinção do bem e do mal moral, que o animal não saberá perceber. A esta ordem pertence ainda a nossa alma espiritual, com a qual podemos conhecer sem revelação, a espiritualidade, a liberdade, a imortalidade. A esta ordem pertencem as verdades naturais que a razão por suas próprias forças pode descobrir sobre Deus, Criador do Universo, Providência universal.
A visão do céu estrelado nos prova a existência de uma inteligência divina que legislou todas as coisas. É ali o ponto culminante da ordem da razão. Ela pode conhecer Deus pelo reflexo das suas perfeições nas criaturas; ela porém não pode conhecer a vida íntima de Deus; as criaturas são impotentes para no-la manifestar. Elas não têm com Deus senão uma semelhança muito imperfeita. Aquele que não conhecesse o Soberano Pontífice senão por ter visto seu palácio do Vaticano, seus empregados, por saber o lugar do seu nascimento, a data de sua elevação ao pontificado, este não conheceria a vida íntima do Soberano Pontífice.
Portanto, a razão abandonada a ela mesma não pode, apesar do progresso das ciências ou da filosofia, chegar a conhecer a vida íntima de Deus. Mesmo se este progresso continuasse por milhares de anos sem interrupção, ela não atingiria o segredo das profundidades de Deus, ao lado do qual os segredos do Oceano não são nada.
3. — Acima da ordem racional, há a ordem da verdade e da vida sobrenatural, absolutamente inacessível aos sentidos e à razão. Os segredos desta ordem, que são a profundidade mesma de Deus, sua vida íntima, nos foram revelados por N. S. J. C. Dizemos todas as manhãs, no fim da missa, no Evangelho de S. João, "No princípio era o Verbo, e o Verbo estava em Deus, e o Verbo era Deus; n´Ele estava a vida e a vida era a luz dos homens. Esta luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam". Ninguém jamais viu Deus. O Filho Unigênito do Eterno Pai no-lo manifestou. "Mas as trevas não o compreenderam". Os homens cegos pelo erro ou pela paixão, não perceberam a luz sobrenatural que N.S. lhes trouxe, eles preferiram a luz da sua razão, como alguém que preferisse miçangas a um diamante. Há realmente três ordens, a dos corpos, a dos espíritos e a da vida íntima de Deus e dos seus santos. Assim como há numa igreja o adro exterior, a nave e o Santo dos santos ou
tabernáculo de Deus vivo.
Referência
Pe. R. Garrigou-Lagrange O. P., A CERTEZA SOBRENATURAL DA FÉ. Disponível em http://www.permanencia.org.br/revista/teologia/garrigou29.html
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